o interior, a solidão, etc.

Michael Maia
2 min readNov 17, 2022

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O pôr do sol já está no fim, deixando aquele lusco-fusco no céu de cores gradientes entre o amarelo e azul escuro. É estupendo assistir esta magnífica arte, o sol indo para outro lugar, a noite se aproximando, e aqui no interior as suas peculiaridades nesta hora do dia: pássaros voando, o barulho de panelas e as pessoas voltando do trabalho para as suas casas, o cheiro de fumaça do fogão a lenha, alguns latidos de cachorros, pessoas caminhando nas ruas, e logo, um silêncio absurdo.

É claro que você ainda escuta barulhos no interior a noite, até umas dez horas existe um bar aberto, alguns amigos indo embora da academia conversando e brincando sobre os pesos do dia, alguns carros passando na rua, motos de delivery, pessoas conversando, uma televisão alta, cachorros brigando, etc. Mas então, após às dez o silêncio cai sobre a cidade.

Quando eu morava em outras cidades, eu dizia que o que mais me assustava quando eu dormia no interior era o medo do sobrenatural, e não de uma violência como nos grandes centros urbanos. Eu tinha medo de encontrar algo que eu não saberia explicar para os outros, de não conseguir correr caso alguma assombração aparecesse para mim. Hoje eu torço para que algo sobrenatural aconteça pois quem sabe assim eu teria algum ponto relevante na vida, e algum assunto para conversar com meus amigos.

Morar no interior é solitário. É acordar e torcer para que o seu dia seja agitado, com crossfit, ginástica, corrida, café da manhã calmo, música alta nos fones de ouvido, almoço corrido, cochilo de 20 minutos, café expresso, lanche ruim da tarde, janta às 18:30h, fruta às 20h, ver o gato te esperando na porta, assistir uma entrevista do roda-viva, rir de um vídeo e mandar para a amiga, e dormir cedo. Pois é exatamente dormir cedo que nos resta.

É claro que existe vida no interior, existem grupos de amigos, rodas de conversas, saídas para os barzinhos, associações de cultura, partidos de esquerda, grupos e grupos para se afiliar e encontrar novas amizades. Existe tudo isso sim, e acredito que se eu estivesse em uma São Paulo da vida, eu também estaria na mesma rotina de casa-exercício físico-trabalho-casa. A vida torna-se chata quando não encontramos um propósito. Seja ele uma casa financiada, uma viagem internacional por ano, crescimento profissional, filhos, e todas os tópicos que os boomers e alguns millennials deixaram para nós.

Talvez, eu digo, talvez eu tenha perdido o propósito ao longo dos anos.
Acho que vou tomar um banho pra passar.

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Michael Maia
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Written by Michael Maia

tomo café sem açúcar pra poder comer doce sem culpa.

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